sábado, 11 de setembro de 2021

Papa Francisco, Fratelli Tutti, 24.

 

Esta imagem é um trabalho do cartoonista Vasco Gargalo que, em 2021, foi selecionado como vencedor, por unanimidade, entre 460 cartoons de 65 países, que responderam ao desafio "E se o seu lápis fosse uma ferramenta contra o trabalho forçado? ".


24. Reconhecemos igualmente que, «apesar de a comunidade internacional ter adotado numerosos acordos para pôr termo à escravatura em todas as suas formas e ter lançado diversas estratégias para combater este fenómeno, ainda hoje milhões de pessoas – crianças, homens e mulheres de todas as idades – são privadas da liberdade e constrangidas a viver em condições semelhantes às da escravatura. (…) Hoje como ontem, na raiz da escravatura, está uma conceção da pessoa humana que admite a possibilidade de a tratar como um objeto. (…) Com a força, o engano, a coação física ou psicológica, a pessoa humana – criada à imagem e semelhança de Deus – é privada da liberdade, mercantilizada, reduzida a propriedade de alguém; é tratada como meio, e não como fim». As redes criminosas «utilizam habilmente as tecnologias informáticas modernas para atrair jovens e adolescentes de todos os cantos do mundo». E a aberração não tem limites quando são subjugadas mulheres, forçadas depois a abortar; um ato abominável que chega mesmo ao sequestro da pessoa, para vender os seus órgãos. Isto torna o tráfico de pessoas e outras formas atuais de escravatura num problema mundial que precisa de ser tomado a sério pela Humanidade no seu conjunto, porque «assim como as organizações criminosas usam redes globais para alcançar os seus objetivos, assim também a ação para vencer este fenómeno requer um esforço comum e igualmente global por parte dos diferentes atores que compõem a sociedade».

Que há que se possa acrescentar a isto? Apenas pensarmos um pouco no que podemos fazer em relação ao trabalho forçado.

Primeiro, manifestarmos a nossa revolta por diversos meios, incluindo pelo apoio à ação de organizações que lutam contra a escravatura no mundo.

Segundo, exigirmos intransigentemente dos responsáveis políticos uma prática de fiscalização eficaz, de punição exemplar e de divulgação pública das empresas que utilizam o trabalho escravo ou forçado na sua laboração. Note-se que este último ponto é absolutamente fundamental para que eu, um cidadão comum, possa escolher com consciência ser um consumidor ético, comprando sem promover a injustiça e a selvajaria (pelo menos neste domínio).

Interrogo-me muitas vezes se as empresas que lucram com este tipo de trabalho desumano não receiam que percamos a confiança nelas, criando em nós uma profunda aversão aos produtos que vendem. A denúncia pública e publicada destas empresas contribuiria certamente para uma ética mais humana. Falo de empresas, mas trata-se, no fundo, dos seus CEOs e esses, com os seus ordenados milionários (e a consequente aprovação social de uma sociedade que valoriza cada vez mais o sucesso financeiro, obtido seja de que maneira for), nunca têm muito a recear, infelizmente.

Como acredito que esta aversão que surge em nós perante as práticas assassinas destas empresas têm a sua raiz num sentido básico de decência, defendo ainda que ele deve ser estimulado naqueles que ainda não são sensíveis a esta problemática.

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