sábado, 14 de agosto de 2021

Papa Francisco, Fratelli Tutti, 11.

 


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11. Mas a história dá sinais de regressão. Reacendem-se conflitos anacrónicos que se consideravam superados, ressurgem nacionalismos fechados, exacerbados, ressentidos e agressivos. Em vários países, uma certa noção de unidade do povo e da nação, penetrada por diferentes ideologias, cria novas formas de egoísmo e de perda do sentido social, mascaradas por uma suposta defesa dos interesses nacionais. Isto lembra-nos que «cada geração deve fazer suas as lutas e as conquistas das gerações anteriores e levá-las a metas ainda mais altas. É o caminho. O bem, como aliás o amor, a justiça e a solidariedade não se alcançam de uma vez para sempre; hão de ser conquistados cada dia. Não é possível contentar-se com o que já se obteve no passado nem instalar-se a gozá-lo como se esta situação nos levasse a ignorar que muitos dos nossos irmãos ainda sofrem situações de injustiça que nos interpelam a todos».

Acho que uma das causas deste retrocesso, pelo menos no Ocidente, reside no facto de os abusos descontrolados dos poderosos, políticos, CEOs, banqueiros e empresários, que levaram a uma crise climática e a uma crise financeira graves, terem constituído profundos golpes na confiança que as pessoas do povo tinham nas elites.

Aquelas elites mostraram-se incapazes de assumirem os seus erros e as suas responsabilidades. O que fez aumentar o medo e a zanga.

Esses poderosos desenvolveram, então, campanhas para desviaram esta zanga justificada das populações (obrigadas pelo poder político, judicial e policial a pagar os desmandos por eles realizados) para segmentos mais fracos e sem voz da humanidade que, por essa mesma razão, não têm conseguido defender-se de forma eficaz.

O Papa incentiva-nos a resistir a estas tentativas dos poderosos para destruir a consciência da nossa humanidade comum. Juntos ou, pelo menos, a nível individual, dia após dia, hora após hora.

Pessoalmente penso que, se achamos que já não somos capazes de o fazer através do envolvimento em grandes movimentos sociais, devemos encorajar as gerações mais novas a tentá-lo. Podemos contar-lhes, aliás, na história do último século, pequenas e grandes experiências de que tal é possível: por exemplo, o movimento pelo sufrágio feminino, ou o movimento do 25 de Abril, etc.

Porque tudo o que ainda desfrutamos de bom tem de ser defendido e conquistado contra a voragem desses poderosos. Todos os dias. E não nos iludamos: com sacrifícios.

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