quarta-feira, 4 de agosto de 2021

Papa Francisco, Fratelli Tutti, 3.

 


(6)

Sem fronteiras

3. Na sua vida [de São Francisco Assis], há um episódio que nos mostra o seu coração sem fronteiras, capaz de superar as distâncias de proveniência, nacionalidade, cor ou religião: é a sua visita ao Sultão Malik-al-Kamil, no Egito. A mesma exigiu dele um grande esforço, devido à sua pobreza, aos poucos recursos que possuía, à distância e às diferenças de língua, cultura e religião. Aquela viagem, num momento histórico marcado pelas Cruzadas, demonstrava ainda mais a grandeza do amor que queria viver, desejoso de abraçar a todos. A fidelidade ao seu Senhor era proporcional ao amor que nutria pelos irmãos e irmãs. Sem ignorar as dificuldades e perigos, São Francisco foi ao encontro do Sultão com a mesma atitude que pedia aos seus discípulos: sem negar a própria identidade, quando estiverdes «entre sarracenos e outros infiéis (...), não façais litígios nem contendas, mas sede submissos a toda a criatura humana por amor de Deus». No contexto de então, era um pedido extraordinário. É impressionante que, há oitocentos anos, Francisco recomende evitar toda a forma de agressão ou contenda e também viver uma «submissão» humilde e fraterna, mesmo com quem não partilhasse a sua fé.

Uma extraordinária recomendação, sem dúvida. Porque este é o melhor caminho para convencer quem achamos que não tem razão e que está demasiado apegado a uma crença perniciosa.

Habitualmente, as pessoas nesta situação vivem no medo e é este que mais as faz agarrarem-se a uma ilusão.

Se as criticamos, ou mostramos de alguma forma que elas não pertencem ou estão em risco de deixar de pertencer ao grupo (seja dos amigos, seja das pessoas racionais, boas, etc.), então elas vão sentir-se ainda mais inseguras e ansiosas, pelo que aferrar-se-ão ainda mais à sua crença (que, aliás, surgiu na sua mente para lhes aliviar o mal-estar).

Se lhes apresentamos provas de que a sua crença está errada, cria-se-lhes uma dissonância cognitiva que as pessoas muitas vezes (principalmente, se a crença é profunda e forte) resolvem aderindo ainda mais acriticamente à crença original, negando vivamente quaisquer evidências contrárias.

Então, segundo a Psicologia, como conseguir mudar a opinião dos outros? Ouvindo-os plenamente, mostrando um interesse genuíno em compreender, aceitando o que nos é dito, fazendo perguntas abertas sobre o que nos suscita realmente a curiosidade e que possam levar o outro a refletir (mas sem crítica nem agressividade, seja explícita, seja escondida).

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