segunda-feira, 9 de agosto de 2021

Papa Francisco, Fratelli Tutti, 8.

(8)

 8. Desejo ardentemente que, neste tempo que nos cabe viver, reconhecendo a dignidade de cada pessoa humana, possamos fazer renascer, entre todos, um anseio mundial de fraternidade. Entre todos: «Aqui está um ótimo segredo para sonhar e tornar a nossa vida uma bela aventura. Ninguém pode enfrentar a vida isoladamente (…); precisamos de uma comunidade que nos apoie, que nos auxilie, e dentro da qual nos ajudemos mutuamente a olhar em frente. Como é importante sonhar juntos! (…) Sozinho, corres o risco de ter miragens, vendo aquilo que não existe; é juntos que se constroem os sonhos». Sonhemos como uma única Humanidade, como caminhantes da mesma carne humana, como filhos desta mesma Terra que nos alberga a todos, cada qual com a riqueza da sua fé ou das suas convicções, cada qual com a própria voz, mas todos irmãos.

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NOTAS

Este parágrafo é tão bonito e tão verdadeiro que apetece não dizer mais nada e deixar estas palavras habitarem dentro de nós, sem a interferência de ruídos exteriores.

Mas sinto alguma obrigação de acrescentar algo. Quem estiver a ler é que não tem a obrigação de continuar, claro! 🙂

Sabemos várias coisas que o Papa recorda aqui.

A primeira é que, quando diminuímos a dignidade dos outros, estamos a diminuir irremediavelmente a nossa própria dignidade (se todos os que que cometem abusos sobre outras pessoas se apercebessem como perdem a sua dignidade...).

A segunda é que somos uma espécie profundamente social e que sofremos muito em isolamento. Assim, e a ciência já o demonstrou, o mais seguro contributo para a nossa felicidade são as relações profundas e significativas que estabelecemos com os outros - consulte-se o Estudo de Harvard, por exemplo: «Harvard study, almost 80 years old, has proved that embracing community helps us live longer, and be happier» (Tradução minha: "Realizado ao longo de quase 80 anos, o Estudo de Harvard provou que envolvermo-nos numa comunidade ajuda-nos a viver mais tempo e a ser mais felizes")

A terceira é que, face aos desafios que a vida nos coloca e perante os ataques feitos pelo poder ao nosso bem-estar, só juntos conseguiremos conquistar uma vida melhor para nós e para os nossos descendentes. Sozinhos, somos fracos e tendemos a desperdiçar esforços, mesmo quando realizados em direções mais frutuosas. Juntos, partilhando sonhos, aspirações e valores, é mais realizável a construção de um mundo mais fraterno para todos, sem a exclusão de ninguém, seja pela idade, pelo sexo, pela religião, pela nacionalidade, etc.

A quarta é que, com um sonho e um projeto partilhados, é mais fácil persistirmos animados a lutar por uma vida melhor para todos.

Deixo apenas um alerta.

Nem sempre juntos criamos e defendemos os melhores sonhos. Por sermos estruturalmente uma espécie social, muito ligada a grupos hierarquicamente organizados, a verdade é que somos todos facilmente manipulados e influenciados por outros, nem sempre para o bem.

A minha sugestão é que devemos ouvir o que, no nosso corpo, as nossas emoções nos dizem. Elas são a sinalização mais fiável de que estamos no caminho certo ou errado, consoante forem limpidamente positivas ou negativas. Se surgirem estas últimas, normalmente desagradáveis ou acordando coisas negras em nós, será mais benéfico que as levemos a sério e mudemos de direção ou abandonemos mesmo o caminho que estamos a seguir.


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